A letra e a parte periférica
A letra e a periferia
“O qual nos fez também capazes de ser ministros de um novo testamento, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata e o espírito vivifica.” II Coríntios 3:6
O maior percentual de pessoas é cristão. Isso é ótimo, porém essa maioria não estuda o evangelho, estuda a letra do evangelho. Aliás, chegam e não passam além da letra.
E a bíblia não pode ser trabalhada meramente em cima da letra como muita gente propõe. Diante do progresso, não dá para ficarmos presos a ela. Na atualidade, vigora a necessidade de uma evangelização não mais com base na pregação sistemática milenar de um evangelho periférico, trabalhado apenas na base da letra.
Para quem já alcançou uma visão mais abrangente do que seja a vida no seu sentido amplo, e que já tem alguma percepção do mecanismo da evolução, o evangelho, analisado sob a forma exterior, não funciona mais, já deixou de atender faz tempo.
Vamos ser sinceros: a letra, sem dúvida alguma, é um instrumento que pode criar dificuldades aos nossos passos. Para início de conversa, a didática é uma coisa e o conteúdo é outra, e equívocos na interpretação muitas vezes ocorrem sabe por quê? Por tomar-se ao pé da letra expressões que são figuradas. Por isso, todas as vezes que nós levamos o assunto para o plano literal nós costumamos ter problemas.
Interpretações estreitas do plano divino obscurecem os horizontes mentais. E quem quiser estudar as escrituras em cima da periferia da letra vai trabalhar contra a natureza.
Em busca da essência
Tem algo muito importante que a gente precisa fixar: a letra bíblica é material didático sem o qual não há aprendizado, mas ela não é a essência do conhecimento. Representa a forma, um instrumento para transferir algo. É recurso precioso por meio do qual a sabedoria de Jesus nos ensina a aprofundar o conteúdo, porque não tem como transmitir grandes verdades fora dos elementos de natureza metafórica ou simbólica.
Como vimos anteriormente, sob as alegorias e símbolos grandes verdades se ocultam.
Muitos aspectos da linguagem são ininteligíveis e alguns até parecem irracionais e ilógicos, o que preceitua a existência de uma chave que possibilite apreender o verdadeiro sentido. Assim, é fundamental, no símbolo e na metáfora, buscarmos a essencialidade. Alargar o entendimento e retirar os substratos dos ensinamentos.
A casca e a proteção
Para entender o evangelho, que constitui o alimento das almas, por uma linha associativa vamos pegar o exemplo da natureza, mais especificamente o exemplo das frutas.
Repare que as frutas, na sua quase totalidade, são envolvidas por uma camada protetora. Esse invólucro externo, a casca, serve para quê? Para conservar a essência do que ela envolve, ou seja, para conservar intacta, saborosa e nutritiva a polpa dos frutos, preservando-as das contingências exteriores a que se acha exposta.
O que a gente depreende disso? Que se a natureza não tivesse protegido dessa forma os frutos desde o princípio, o homem jamais chegaria a utilizar-se deles. O que nos dá, também, uma vaga ideia da sabedoria da espiritualidade ao longo do tempo para preservar a mensagem espiritual.
E se o maior instrutor e guia da humanidade não tivesse envolvido seus ensinamentos no manto dos símbolos e das parábolas, com certeza eles não teriam chegado a nós.
Então, com os ensinamentos da boa nova, que contém verdades essenciais, o processo é o mesmo dos frutos: imperioso sair do periférico e buscar dentro a essência.
Ingestão sem mastigar
A maioria das pessoas ingere o material didático como se fosse o conteúdo, como se fosse a essência. Está dando para acompanhar? Despreza o espírito que vivifica e mantém-se restrita à letra que mata. Em outras palavras, come qualquer fruta com a casca e na maioria das vezes sem mastigar. E o que é pior, ainda procura convencer os outros, e muitas vezes consegue, de que é assim que devem comê-la.
O religioso tradicional, por exemplo, e muitos aprendizes nas diversas escolas, que ainda não pegaram o sentido íntimo, estão procurando a essência dos textos na área exterior.
E por insistirem em comer as frutas com as cascas, não experimentam a essência dos ensinamentos, cheios de vitalidade, sabedoria, encantamento e profundidade. A forma alegórica e o intencional misticismo da linguagem fazem com que a maioria leia por desencargo de consciência e por simples dever.
Resultado: Leem, mas não entendem; leem, mas não tiram proveito. Estudam, mas não se entusiasmam, não se modificam interiormente. Estudam, mas não sentem a satisfação brotar de suas intimidades. Passam-lhes despercebidos os preceitos morais.
Exposições vazias
De fato, não são poucos os que permanecem situados na periferia do evangelho.
Muitos oradores e expositores, você já deve ter reparado, apresentam brilho nas palavras. Agradam aos ouvidos, são aplaudidos no final e ficam felizes com que conseguiram. Mas se apertar não sai nada.
Não tem tanta gente que manipula as multidões e no fritar dos ovos não transmite nada? Não fundo, nada revelam de substancial aos corações. Aí, pode-se inclusive perguntar: Será que quem ouve consegue tirar algum proveito ou o que é falado serve apenas para um entretenimento momentâneo?