João Batista e o deserto – Parte 9

O arrependimento I

Arrependimento é a base

Após deixar o remorso a pessoa entra no arrependimento. Quer dizer, quando ela chega ao arrependimento é porque normalmente já passou pelas causas e pelos trâmites do remorso, está cheia de remorso. Arrepende porque conseguiu sair do remorso.

Logo, arrepender é mais do que ter remorso. Ao cair em remorso, ela começa a laborar dentro de si mesma um processo de arrependimento, de forma que o arrependimento é um estado além do remorso e pouco aquém da obra de ressarcimento, resgate ou reparação.

Surge a todo aquele que fez o que não devia, deu exemplos menos felizes ou andou por caminhos que não eram aconselháveis. Basta lembrar que diante de um fracasso há sempre um recomeço.

O primeiro passo para o crescimento é o arrependimento. Ele é fundamental. É a base da melhoria espiritual. Corresponde a uma proposta sem a qual vai ser muito difícil alguém ter êxito na nova disposição. Sem ele não há o reconhecimento da falha, a necessidade de mudança, a reparação consciente e muito menos a regeneração do espírito.

Sempre pode ser acionado

Se você errou, mesmo que de forma desastrada, não se desespere. O reerguimento é a melhor medida. É a decisão acertada para aquele que erra.  Sempre existe a recuperação do pecador que deseja recuperar-se. Sempre! Não importa a dimensão do erro, pode haver redirecionamento em qualquer momento. Para isso é preciso a presença do arrependimento.

O Criador, com a sua infinita e extraordinária bondade, nunca fecha a porta ao arrependimento. Pelo contrário, abre os braços para receber os filhos culpados que um dia, cansados de tanto sofrer como filhos pródigos, lhe retornam ao coração com a decepção dilacerante e o orgulho abatido.

O recado que temos aprendido é que se não nos predispusermos a avocar o arrependimento para caminhar, ainda que com dores, tribulações e dificuldades, nós não avançamos e podemos entrar em complicações maiores. Ao negá-lo nós acionamos a lei do retorno.

Vamos pensar nisto. É por não buscá-lo tantas vezes que o nosso caminho, em muitos aspectos e por muito tempo, tem sido um caminho de desapontamento e dor.

Renovação e elasticidade

Para abreviar o tormento que flagela de mil maneiras a consciência, reencarnada ou desencarnada, é fundamental a renovação mental. É o único meio de recuperar a harmonia íntima, pois ninguém progride sem se renovar. Não existe mudança de fora sem a mudança de dentro. Não existe regeneração exterior sem a interior.

Renovação mental é a mudança da vida. É necessário assimilar ideias novas com as quais possa trabalhar, mesmo que devagar, melhorando a visão interna e estruturando novo destino.

O arrependimento propicia elasticidade dos componentes íntimos e possibilita melhor capacidade de compreensão. Abre, como num painel, a perspectiva de quitação para o ser.

Ele reconhece que as suas escolhas não foram acertadas, aprende a lição e detecta a possibilidade de fazer diferente. Percebeu? Equivale a um sistema de recomposição do destino relativamente ao que se tem feito até agora. Essa é uma das belezas do arrependimento: a consciência, discernida, buscar fazer de outra maneira.

Incompatibilidade e mudança

Se o remorso não acrescenta nada, o arrependimento faz a diferença. É uma sensibilização na qual a pessoa observa que o que fez ou está fazendo não é mais compatível com a sua nova linha perceptiva. Por ele surge um conflito íntimo em que ela percebe que não pode mais sequenciar aquilo, que ela tem que alterar. Esse é o significado. Por isso existe uma proposta embutida dentro dele de uma nova posição no contexto.

O arrependimento representa a modificação na intimidade para uma nova base de ação. Sugere mudança de atitude, de procedimento. É o mesmo que alguém voltar atrás em relação a um compromisso assumido. Se vinha descendo de erro em erro e caindo pela sucessão de falhas, é como se curvasse diante da lei divina. Daí, para, deixa de se comprometer e projeta-se para a frente, iniciando o retorno pela mudança das ações.

Arrependimento estanque não vale

Arrependermo-nos de qualquer gesto maligno praticado é um dever, concorda?

Agora, essa coisa de ficar curtindo arrependimento para depois continuar errando e dando pancada nos outros não quer dizer nada. Não significa absolutamente nada. Verdade seja dita: a maioria das pessoas que se arrependem não avançam.

Tem aquelas que fazem o teatrinho do arrependimento. Entristecem, se abatem, entram na fossa e até caem em depressão. Ficam nessa fase algum tempo. Daí a pouco dão um jeito de sair dessa situação, aquilo passa, elas não mudam e fica por isso mesmo.

Se ficarmos só no arrependimento sabe o que acontece? A resistência íntima do nosso psiquismo nos mantém retidos na retaguarda. Afinal, o desespero ou a revolta não solucionam os compromissos que o devedor contraiu quando usou a sua própria vontade.

Outra coisa a ser considerada: o que é o arrependimento? É um sentimento. Logo, arrepender é uma forma de sentir, certo? E o que o evangelho nos ensina? Que a cada um será dado conforme as suas obras. Não será dado conforme o grau de arrependimento, os livros que leu, as ideias que teve, os projetos que criou, as emoções que nutriu.

O arrependimento por si só não basta. Não podemos ficar só nele. Não basta o sentimento, é imperioso as obras.

Ele é caminho seguro para a regeneração, jamais passaporte direto para a vida mais alta. Consiste na primeira etapa. Pranteá-lo indefinidamente é roubar tempo ao serviço de retificação.

Reconhecer nossos erros, praticados em qualquer setor da existência, é o primeiro passo para a reabilitação, no entanto é empreendimento nulo se não decidirmos nos corrigir com humildade e paciência na execução dos deveres que a vida recomenda.

É uma questão de lógica. Se não é possível trair o tempo nas reparações necessárias, e se o estacionamento não resolve problema algum, o espírito paralisado no arrependimento não consegue progredir enquanto não quitar os seus débitos com a própria consciência.

Uma vez estabelecido o nódulo de forças mentais desequilibradas, é imperioso que acontecimentos reparadores se contraponham ao modo enfermiço de ser.

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