O melhor campo I
O amor e a multidão de pecados
“Mas, sobretudo, tende ardente amor uns para com os outros; porque o amor cobrirá a multidão de pecados.” I Pedro 4:8
Simão Pedro, em uma de suas cartas (ou epístolas), nos lembrou há milênios que “o amor cobre a multidão de pecados”. Em algumas versões o verbo é cobrirá, a definir que o amor teórico cobrirá quando se transformar em amor aplicado, ou seja, em caridade.
E ao dizer que o amor “cobre” (ou cobrirá), ele quis dizer que a ação no bem atenua ou, quem sabe, liquida e até ultrapassa os impositivos da justiça. Pois conforme a contabilidade divina, apenas o bem que se faz diminui ou extingue o mal que já se fez.
Várias passagens nas escrituras (no velho e novo testamento) asseveram que o amor dinamizado propicia a renovação e a redenção. E mais, que em todo universo ele é a única força que anula as exigências da lei de talião. Que as criaturas humanas se redimirão definitivamente por ele, resolvendo situações de acentuada complexidade, respaldarão o destino e se elevarão a Deus por ele, pela instauração da segurança e da paz.
Nosso compromisso
Aos poucos, passamos a entender o amor como sendo uma boia que nos é oferecida para que consigamos atravessar um mar de dificuldades que pode nos levar a sucumbir. E aprendemos que o plano aplicativo nos terrenos do bem é hoje o melhor campo para se resolver problemas, por meio do qual nos despojamos, gradativamente, das imperfeições. Porque até então tentamos adquirir o novo piso pela teoria e não deu certo.
O fato é que custamos, mas percebemos que a melhor forma de ser ajudado (pelos maiores) é ajudando (os menores). E o esforço desinteressado em favor dos outros torna-se o maior apoio que damos a nós mesmos, pois é pela aplicação do conhecimento que estamos tentando resolver as dificuldades particulares da nossa caminhada.
Porquê
O momento atual não está fácil para ninguém. Pelo contrário, temos recebido um sobrepeso nas nossas costas. No entanto, a espiritualidade vem mostrando que as linhas cármicas, que de modo irreverente chegam sem pedir licença e nos pegam pelo pé, podem ser desativadas às vezes com uma facilidade maior do que a gente imagina. Porque se o amor cobre a multidão de pecados, podemos eliminar as linhas densas que impedem o progresso e nos fazem sofrer se nós efetivamente amarmos. Não filosoficamente, numa posição teórica, mas dentro de uma linha prática de espírito de vida.
É por isso que nós sempre iremos bater na tecla do aspecto aplicativo e científico do evangelho. Quem ama já está resolvendo as suas complicações. Talvez você não saiba, mas é possível respaldar muita coisa do destino por essa forma de agir. É que ajudando aqui e ali, gerando novas causas com o bem praticado hoje, podemos interferir nas causas do mal praticado ontem, resgatando o montante de nossos débitos do pretérito, reconquistando o equilíbrio o quanto possível e ganhando tempo e novas bênçãos.
Não tem outra alternativa. É o trabalho que nos redime, e pronto. Como foi dito pelo apóstolo, a questão é cobrir o mal com o bem. Cada boa ação que praticamos apaga uma das nossas faltas passadas. E a caridade é o componente saneador, pela qual as sombras pretéritas são saneadas e dissipadas. Logo, não adianta, os nossos grandes problemas, no plano das responsabilidades pessoais, não serão resolvidos enquanto não distribuirmos para os outros. Aquele que não se exercitar nessa área nunca irá respaldar as manchas difíceis da sua personalidade. Ele será sempre um inconformado.
O semeador saiu a semear
É assim que as coisas funcionam. E se possuímos pretérito culposo a redimir, o criador, com a sua misericórdia fantástica, não quer o estigma de pagar, quer o trabalho do amor. Daí ninguém precisa aguardar reencarnações futuras, entretecidas de dores e lágrimas e em ligações expiatórias, para diligenciar a paz com a consciência denegrida e os inimigos do ontem. A experiência humana pode ser doloroso curso de renunciação pessoal, mas é também uma escola em que o espírito de boa vontade pode alcançar culminâncias.
Para isto, é preciso abrir o coração à bondade e ao entendimento. O processo não está no fechar, está no abrir. Porque não temos como solucionar questões intrínsecas dentro de um sistema restrito ou em uma luta conosco em um quarto fechado.
Então, não podemos desconsiderar a necessidade de fazer algo para conseguir o amparo que necessitamos. Como fez o indivíduo na parábola do semeador, que segundo os registros não agiu por intermédio de outros, mas ele mesmo saiu a semear, somos compelidos a sair de nós próprios e lançar sementes de auxílio junto dos que transitam no mundo em dificuldades maiores que as nossas. A lei é clara: ninguém recebe sem dar.
O que eu vou dizer pode soar estranho para algumas pessoas, porém temos que resolver o nosso problema do mundo íntimo pela capacidade de amar e de ser útil. Isso já passou pela sua cabeça? Nós estamos hoje aprendendo a identificar recursos para trabalhar no lenitivo das nossas próprias dificuldades. Fazer algo pelo bem alheio para encontrarmos o nosso, ajudarmos para sermos ajudados, consolarmos para termos consolo. É o trabalho no âmbito positivo do amor que vai nos ajudar a tirar os pontos de sombra da nossa intimidade. Aliás, operando no bem encontramos harmonia e paz e liquidamos muita coisa do passado complicado que trazemos sem saber.