O testemunho II
Perante nós mesmos
Outro detalhe fundamental: nesse instante nós sempre nos achamos aparentemente sozinhos com as nossas aquisições íntimas. Entendeu bem isso? Não tem como ser diferente. Na maior parte das vezes o nosso testemunho é feito de uma forma isolada, mediante uma postura puramente pessoal e não por uma declaração pública, o que significa que ele não é perante os outros mas perante a gente mesmo.
Por representar um exercício de capacidade aferidora, é de ordem mental e materializa-se sem estardalhaço, de forma discreta, silenciosa, velada, na própria intimidade, em cima dos movimentos da nossa consciência. E você já deve ter reparado, as batalhas mais importantes são as que lutamos diariamente no silêncio da alma.
É por isso que ele praticamente é capaz de nos redimir na essencialidade. Normalmente, a testemunha tem um espírito de sobrepeso e de sofrimento, porém nem sempre em cima do corpo físico, e sim em cima de uma estruturação íntima, representando a soma de contingentes que marcam a individualidade no plano profundo.
O testemunho de Jesus
O testemunho de Jesus foi tão extenso que percorreu os milênios, cujos quadros estão vivos juntos de cada um de nós. E deixou normas que não devemos esquecer.
Ele não criou débito que o fizesse merecer a sentença condenatória. Aliás, conhecia as leis e os crimes da época, e possuía sólidas razões para reclamar o socorro daquelas. No entanto, que justiça reclamou para si quando vergava sob a cruz?
Defendeu os interesses espirituais da coletividade e manteve-se vigilante no que se refere ao direito dos outros, todavia no seu julgamento guardou silêncio e conformação até o fim. Preferiu silenciar e passar. Demonstrou que sempre será heroísmo o ato de defender os que merecem, mas absteve-se de fazer justiça a si mesmo, para que os aprendizes da sua doutrina estimassem a fidelidade divina nos problemas graves da personalidade, fugindo aos desvarios que as paixões do eu podem criar.
Não enviou substitutos ao calvário ou animais para o sacrifício nos templos. Abraçou, ele mesmo, a cruz pesada, imolando-se em favor das criaturas e dando a entender que todos os discípulos serão compelidos ao testemunho próprio no altar da vida.
Renunciar e saber valorizar
O testemunho constitui aquele momento em que os passos foram todos ajustados para que haja a possibilidade de êxito, seja na conquista de um novo patamar ou na quitação e no respaldo com os débitos pretéritos. Daí a gente nota que esse exercício é dificílimo, tanto que em muitas situações o desprezamos. E quando não desprezamos e somos testados, na capacidade de amar e de aplicar, sabe o que acontece muito? Costumamos reagir, reclamar e entrar em um plano de inconformação.
Logo, vamos com cautela. O testemunho tem nos intimidado, desencorajado e amedrontado. Sem contar que o progresso aparente dos ímpios enfraquece muitas almas.
Em momento algum estamos dizendo que é fácil. Só não podemos mais ficar naquela de pedir que ele seja afastado de nós. É preciso coragem e ousadia, e lembrar que a hora de crise é a hora da luta, e o momento da incerteza é o instante da prece.
Quando os assuntos difíceis e dolorosos nos envolvem convém moderar os impulsos da reinvindicação. Nem sempre nossa vida incompleta nos deixa perceber a dimensão da dívida que nos é própria. O que precisamos é aprender a incorporar a serenidade na postura de testemunhar, uma vez que todo sacrifício, imposto ou espontâneo, desde que aceito sem revolta e sem indiferença, redunda em ganho para a alma.
Se o testemunho representa entregar-se, a renúncia é um componente preponderante por meio da qual conseguimos passar com êxito. Assim, embora as dúvidas e contestações que te cerquem os passos, segue adiante atendendo aos deveres que a vida te preceitua conforme os ditames e as orientações da sua consciência.
Testemunha quando? Sempre!
Não basta apenas manter aceso em nós o ideal superior, é preciso mostrar-lhe a grandeza nas manifestações do dia a dia. É por isso que as testemunhas verdadeiras são aquelas que vivenciam o conhecimento, porque uma das virtudes do discípulo é a de estar sempre pronto ao chamado da providência, não importa onde ou como.
As almas convertidas ao Cristo lhe refletem a beleza nos mínimos gestos, seja na emissão de uma frase curta, na desprezada cooperação a alguém ou na renúncia silenciosa que a apreciação terrestre não chega a conhecer. Vivem o que aprendem a todo instante, principalmente quando chamados a agir em situações adversas, onde lhes é exigida grandeza moral diante de vícios e imperfeições das pessoas próximas.
A nós, que já nos propusemos ao processo de evolução consciente, compete lembrar a condição de servos de Deus para lhe atender ao chamado em todas as circunstâncias, seja nas horas de tranquilidade ou de sofrimento. Ou falei alguma coisa errada?
Acima de todas as felicidades transitórias é preciso ser fiel ao evangelho. Porque é fácil provar a fidelidade e a confiança na misericórdia divina nos dias de calma. Difícil é manter a dedicação nas horas de turbulência, quando tudo parece contrariar e perecer.